segunda-feira, junho 05, 2017

GÊNIO EM REVISTA

Mostra:  Tom Zé 80 Anos abre nesta quinta-feira na Caixa Cultural homenageando vida e obra do artista baiano que conquistou o mundo

Tom Zé chutando à esquerda... Foto André Conti
O estimado leitor veja como são as coisas. Nos idos do início dos anos 1950, ninguém apostava um tostão furado no então adolescente Antônio José Santana Martins, “tido como futuro delinquente”, como ele mesmo lembra, por telefone.

Pois bem, nesta quarta-feira, uma exposição na Caixa Cultural será inaugurada para celebrar e homenagear vida e  obra deste artista baiano de primeira grandeza.

Intitulada Tom Zé 80 Anos, a mostra, que tem sua primeira montagem na Bahia natal do gênio de Irará, reúne obras gráficas, digitais e interativas que ilustram sua trajetória.

Com curadoria do designer e produtor de mídia interativa André Vallias e idealizada pela produtora e cantora Bete Calligaris, a mostra ainda traz a instalação Estudando o Sampler, criada pelo coletivo Sangue no Silício, de Cachoreira.

Inspirada na trilogia tomzéniana Estudando o Samba (1976), o Pagode (2005) e a Bossa (2008), a atração transforma uma sala inteira em sampler, ativado pelos movimentos dos visitantes por meio de um sensor.

A cada item da exposição, textos do antropólogo e historiador  Antônio Risério iluminam o visitante.

“Eu já conhecia Bete, mas me surpreendi com essa equipe tão sofisticada!”, admira-se Tom Zé. “O Risério! Que luxo! Parece que sou um grande astro!”, gargalha.

“Mas eu e Neusa (esposa) ficamos admiradíssimos. A gente já conhecia o Risério, claro, mas o Valias foi um verdadeiro achado”, elogia.

De partida para os Estados Unidos, onde fez show sábado na prestigiada BAM (Brooklyn Academy of Music, Nova York), ele garantiu que estará na abertura da mostra: “Claro que vou, com grande alegria”.

"O cartaz (do show no BAM) apareceu um mês atrás, o David Byrne botou uma coisa no site dele convidando os amigos, o Tom Cavalcanti filmou o cartaz lendo o que tava escrito, comentando, os ingressos estão esgotados, uma maravilha", comemora.

“Mas soube que vem um ônibus de Irará (para a abertura da mostra), com Roberto Martins, Antonio Luiz, o presidente da banda de música, que agora me escapa o nome”, diz.

Meio nostálgico, ele passa a desfiar um rosário de nomes entre parentes, vizinhos e amigos (alguns conhecidos) e suas histórias.

“A principal emoção dessa exposição para mim é encontrar as pessoas, como Mestre Pastinha, que claro que já morreu, mas foi meu professor nos anos 50, depois conheci Gildo Alfinete e Roberto Satanás, e nos anos 60, com Pastinha já aposentado, fazíamos shows na casa dele, no Pelourinho, para os turistas. Os meninos dançavam capoeira, eu cantava aquelas músicas completamente loucas (risos) e aí passávamos o chapéu e dividíamos o dinheiro com Pastinha”, lembra.

“Então, além de rever Alfinete e Satanás, quero rever também o (José Carlos) Capinam e o pessoal do CPC (Centro Popular de Cultura) com quem trabalhei muito tempo – enquanto o CPC existiu, até 1964, quando a ditadura jogou tudo fora”, lamenta.

“Não sou gênio”

...Tom Zé chutando à direita. Foto André Conti
Aquela história de “futuro delinquente” lá do primeiro parágrafo se refere à essas lembranças: “Quero conviver com a lembrança de professores que salvaram minha vida nos anos 50. Os professores Belmira Santos e Armando Bahia Monteiro salvaram minha vida. Porque  em casa eu estava tido e tomado como futuro delinquente, e essas criaturas fizeram eu me apaixonar pelos estudos”, conta.

“Uma curiosidade é que eu era de família comunista e Dr. Armando era de família integralista! (risos) E ele nunca soube! Não é que eu escondesse, mas acredito que ele nunca soube”, diverte-se.

"Cheguei aí (em Salvador) em 1950, para fazer o ginásio. Salvador tinha 450 mil habitantes, já pensou? Quando passava um carro na rua você dizia "Lá vai Doutor Fulano para o hospital", ri Tom Zé.

"E meus colegas do seminário, Fernando Cerqueira, Jean Maria Oliveira, que foram de minha turma e juntos vermos as coisas, a própria exposição, e juntos prantearmos a ausência de (Ernest) Widmer e (Michael) Kollreuter, que foram grandes, e com outros professores, formaram uma das melhores escolas de música do mundo, onde tivemos o privilégio de nos formar. E depois meus parentes, meu irmão Augusto, que está muito recolhido. Tia Luiza, tia Nila, tia Wanda! E sim, receber o publico que viu os primeiros shows desse grupo e foi o nascimento do Tropicalismo no Teatro Vila Velha. Minha tia Gilka, que me tirou de Irará para vir seguir a carreira de compositor, porque eu tava ficando lá, morando lá tinha até uma loja lá e minha tia conseguiu que minha irmã Margarida consentisse que eu fechasse a loja para vir à Salvador. Renatinho, meu amigo dos Barris, já em 56, 57, nunca mais vi Renatinho", lamenta.

"Ver essas pessoas todas e avaliar esse mistério que é o tempo passando e gente continuando amigos e gente com saudade uns dos outros. E Nemésio Sales, Geraldo Sarno (cineasta), inclusive essa semana fiz uma música para um filme dele aqui em São Paulo. Morávamos em um só apartamento eu, Nemésio que era secretário-geral do Partido, e Zé Alberto Bandeira que era o atual secretário do Partido Comunista! (risos) Então, essas pessoas, eu tenho muita saudade. E tenho muita gratidão! Por que eu era muito tímido, nossa senhora, minha vida era um horror! Imagine, eu que era muito tímido, fui para o palco! (risos) Essas, as contradições mesmo", admira-se.

Na mostra, outra atração será alguns instrumentos criados por Tom Zé, a maioria deles inventado nos anos 1970. "Sim, criei antes de Estudando o Samba. Eles foram lançados no Teatro do GV, cerca de 1972 que fiz um disco, que não tinha nada a ver com isso, Correio da Estação do Brás. Tanto que o diretor da (gravadora) Continental, o Cesare Benvenutti, não queria ir. Aí no último dia botei até parente meu para tomar conta da filha dele que estava doente, ele foi no último dia, ele ficou vermelho, com a felicidade, me abraçou, quis levar o negócio adiante, quis refazer os instrumentos com mais cuidado. Agora os instrumentos já estão numa terceira geração, que foram modernizados, simplificados, em tamanho menor e com mais recursos, as buzinas agora podem fazer dinâmicas, podem fazer glissandos. Toda aquela parafernália agora se tornou um simples aparelhozinho, que não dá nem para fazer fotografia", relata.

"O instrumento das enceradeiras, não era ligar as enceradeiras que era o barato. Eram colocados microfones de contato, que tinham nascido naquele tempo, que vinham para uma mesa e os instrumentos eletrodomésticos naquele tempo eram de metal. Então, quando ligava, gerava uma vibração de metal em vários lugares diferentes, dava vários sons diferentes no próprio aparelho. A gente puxava para uma mesa e aí quando o público vinha a gente selecionava as coisas com os efeitos, não era um simples motor tocando. Mas as buzinas era o contrário. Se o lugar, o teatro fosse pequeno, derrubava o teatro! (risos). Não, não tinha influência de Smetak, por que nasceu por causa de outra coisa. Um dia a Neusa me mandou consertar uma enceradeira quebrada. Aí eu vi que um dos defeitos era que, quando você acionava o motor, ela disparava. Quando você soltava, ela parava imediatamente. Aí eu, ô! (admirado) Não ficava com aquele decrescendo longo. Ela parava imediatamente. Pensei: isso é um instrumento musical. Aí peguei uma outra velha e tentei remodelar para ficar como aquela. E aí fiz um instrumento com vários utensílios de casa. Lembro das reportagens que saíram na época: "A cozinha vai para o palco", diverte-se.

Artista que não tira férias, ele conta estar “sempre pensando no próximo disco. Eu trabalho dia e noite nisso. Não se se consigo fazer para este ano ou para o ano que vem. Mas tem uma expressão que fala aí na Bahia que diz que 'Mulher que fala muito perde logo o seu amor'. E em música é assim mesmo. Se você fala, você mata o disco. Não sou gênio, que chega em casa, faz uma música e o público canta o ano todo. Não, eu faço música por cognitivo, não por contemplativo. E  faço com dificuldade, elaborando, errando e tal”, ensina, humilde.


E aí, Tom Zé: Diretas Já? "Claro! Todo mundo tá diretas já e fora Temer e todo mundo é perseguido pelos direitistas de plantão, que não sei porque viraram a cabeça e passaram a apoiar Temer. Não sei que diabo tem na cabeça deles", conclui, reflexivo.

Exposição Tom Zé 80 anos / de 8 de junho a 6 de agosto, das 9h às 18h, de terças-feiras a domingos / CAIXA Cultural Salvador (Rua Carlos Gomes, 57, Centro) / Entrada franca

Um comentário:

Rodrigo Sputter disse...

vi que tom vai fazer 81 em outubro...estamos atrasados e recebendo a mostra por último, ou a expo está "atrasada" nacionalmente...independente de qq coisa...vai ser foda...quero ver se vou na abertura e outros dias tb...

na verdade teoricamente nas fotos ele tá chutando primeiro a direita...e depois à esquerda (acho que fiz uma brincadeira com o A...ehehehehe...nem sei muito sobre crase...Ernesto que é bom disso...)...

Chico, fique chateado comigo não viu, fiz uma brincadeira no último post..sei que jamais vc falaria isso...foi só uma brincadeira com as polêmicas sobre o rock...aliás...é bom o rock tá de volta a ser uma coisa odiada...afinal, esse foi o motor pra ele viver cada vez melhro...